domingo, 29 de maio de 2011

.quartas de final, amor em tempos de copa.

Leia ao som do Hino do Brasil por Olodum
_______________________________________


Eu nunca fui fã de futebol, não sei, apenas não rolou, na infância porem amava assistir a copa do mundo, vibrar com toda vizinhança, toda aquela coisa mãe, pai, avô, avó, tia, papagaio e cachorro juntos vibrando na frente de uma televisão. Na adolescência rebelde (sem causa) fiz questão de odiar tudo isso, e depois apenas fiquei assim, normal, era mais uma copa, eram mais muitos folgos, era o Brasil como eu já o conhecia tão bem.
Foi aí que percebi que naquele meu ano holandês era ano de copa, e lá se eu não soubesse continuaria sem saber praticamente, afinal onde estavam as ruas, calçadas, muros, hidrantes, postes pintados? Onde estavam os camelos vendendo até a mãe pintada de verde e amarelo, cornetas (que viraram vuvuzelas) a cada metro quadrado ? Onde estava tudo isso? oh no.
Fiz questão de comprar pra Amber, que amava decorar todas as coisas do universo, bandeirinhas laranjas pra enfeitar a frente da casa e eu e a Hanna preenchíamos a tabela de jogos todos os dias.
Cogitavam a possibilidade da Holanda jogar contra o Brasil, mas mesmo os holandeses achavam muito difícil, afinal já eram décadas que o pais deles não passava nem da primeira fase. Eu assistia aos jogos das duas seleções, os holandeses com as crianças em casa comendo chips de paprika (meu favorito) e aos brasileiros com a comunidade brazuca em um bar no centro de Den Haag e sei lá, era muito emocionante tudo aquilo. Uma vez assisti em casa com duas amigas brasileiras, e minha hostmother disse que nunca tinha visto pessoas tão felizes com um jogo de futebol.
Estranhamente a copa tomou um curso inesperado e a Holanda iria mesmo jogar contra o Brasil, a família saiu para assistir ao jogo deles em um bar na praia e me deixaram chamar quem quisesse para assistir em casa, daquela vez não poderíamos sair nas ruas, tudo estaria laranja. Os holandas tinham pouca esperança de ganhar, senão nenhuma, e eu certa que eles não tinham que ter mesmo. Aline, uma grande amiga paulista veio me fazer companhia e enquanto nos entupíamos de cola-cola e mais chips de paprika vimos nosso pais perder para aquele que nos acolhia, lembro que nem consegui terminar de assistir a partida, fui pro quintal e deitei na grama, era um dia quente de verão holandês, depois enfiei meus pés nas águas do canal que corria no fundo da casa, nem conseguia identificar que a Holanda fazia mais gols ou não, a comemoração holandesa era tão discreta e sem vida e aquilo me irritava profundamente também. Aline veio finalmente me encontrar dando a noticia da derrota e eu inesperadamente chorei e nunca entendi ao certo o porque, ela estava com muita raiva, acho que contia lágrimas também, e eu a limpar as minhas, me deixavam a vista tão embassada, nunca tinha chorado por causa de futebol antes e nem conseguia me justificar, mas me permiti chorar, era preciso. Não era só amor pela patria em tempos de copa, era aquele amor que a gente sentia tão forte por estar tão longe refletido alí, naquela ação coletiva.
Quando as meninas chegaram em casa, estavam tão felizes com a vitoria inesperada holandesa mas fizeram de tudo para conte-la por minha causa e me abraçaram com grande ternura. "Jenny, proxima vez o Brasil ganha, veja a gente, fazia uns 40 anos que não chegavamos tão longe"
E foi por elas e com elas que eu fui assistir ao jogo holandês contra o Uruguai na praia algum tempo depois e durante toda a partida forcei uma alegria com os gols holandeses e ainda mais com a  vitoria, torcia secretamente para o Uruguai (háhá). Só que aí, quando vi as meninas cantando e dançando na areia, no fim daquele dia de verão com o céu em tons azuis e purpura, esqueci de tudo aquilo, eu tinha tido a mesma alegria na minha infância e naquele momento era tudo que queria dar pra elas, aquela alegria pueril de jogos de copa.


A Holanda perdeu na noite que tínhamos nos separado para as viagens de verão, eu estava em um avião em direção a Islândia e elas na Áustria com os pais. Todo aquele mês que havíamos acompanhado os jogos, decorado a casa, comprado figurinhas e álbuns acabava ali e nunca mais tocamos no assunto.


Porem, aquelas lágrimas, aquela amiga partilhando a mesma alegria, a mesma dor e o céu em tons de azul e purpura com aquele canto de crianças felizes eu nunca esqueci, nunca mesmo.


Eu e Aline, no famoso Fiddlers para o jogo do Brasil x Costa do Marfim (acho rs)

quarta-feira, 11 de maio de 2011

.mistério do planeta.





leia ouvindo Mistério do Planeta - Novos Baianos


____________________________________________________

Sylvie disse:
- Você não quer subir hoje anoite pras montanhas menina? Já está todo mundo lá !!
- Ah okay, estou um pouco cansada da viagem mas tudo bem, porque não?
Estávamos na casa de seus pais, no pequeno vilarejo de Kayserberg, Alsace, França. Grandes amigos dela nos esperavam em uma cabana no topo de uma montanha entre a França e a Suíça para a celebração do ano novo, era dia 30, eu tinha acabado de chegar de quatro dias em Paris, e ela estava inquieta, não queria mais esperar, nem o amanhecer nem nada, e eu maluca que sou, topei sem questionar muito.
Fazia uns -5 lá fora e começamos a subir de carro as montanhas, cada quilometro percorrido os graus iam baixando, chegou um momento que de carro não era mais possível, então descemos e descemos todas as mil coisas que Sylvie queria carregar lá pra cima junto com a gente, bebidas, comida de ano novo e tudo mais, e eu ainda pensando que a cabana era só alguns metros dali.
NOT. A cabana era a a sei lá uns 700 metros dali em ascendência constante, tínhamos quilos de coisa pra subir e um frio já beirando os -15, uma lanterna que funcionava a base de energia da força humana, um trenó onde colocamos as coisas e aparatos de fazer esqui. Naquele momento eu queria matar a Sylvie, mas jamais o faria porque a amo muito então a solução foi rir e contemplar o céu estrelado. Como nossa garrafa d'agua deslizou do trenó e se perdeu, quando batia a sede o jeito era apanhar neve e deixar ela derreter na boca.
Depois de uns 10 minutos ou mais de caminhada, quando já estávamos cogitando a possibilidade de enterrarmos as comidas e vinhos na neve para buscar ao amanhecer, dois meninos do grupo vieram ao nosso encontro para ajudar e lá fomos nos, foram mais uns 20 minutos de subida, e lá em cima a neve estava tão densa e alta que metade da perna as vezes se afundava, e teve até um penhasco assustador, até hoje não entendi ao certo do porque a ideia de fazer a subida tão tarde, coisas de Sylvie que no fim são sempre divertidas.
Nunca me arrependi de ter subido as montanhas, foram tres dias em um lugar que ao amanhecer parecia que estávamos acima do céu, as nuvens lá embaixo, e o sol brilhava quase sempre, nevou na descida no entanto, mas foi muito bonito. Lá em cima gente de dois lados totalmente opostos da França, alsacianos e bretões e uma brasileira, que apartir de algumas horas tinham virado companheiros, dividíamos as refeições e tudo. Gente muito única, como um moço que trabalhava ensinando presidiários a cultivarem seus próprios legumes e outras singularidades assim.
Em uma manhã caminhei horas ouvindo Novos Baianos, meu olhos já mal conseguiam absorver tanta neve e tanta beleza, tanta paz, os raios de sol entre as arvores, e a musica me dava toda essa sensação paradoxal e estar alí, lembrando das ruas da minha cidade brasileira. Era terno.


Sylvie estava muito preocupada quando voltei, acreditando que eu tinha caido de um penhasco e morrido, na mesma tarde uma amiga dela que chegou me perguntou "Ah você é a irmãzinha da Sylvie certo?"


E mesmo que o jantar de ano novo tenha sido rã ao molho e o chuveiro da cabana ficar em uma área que não tinha NENHUM tipo de aquecimento, eu estava feliz, eu estava feliz demais. 



Saudades dessas famílias espalhadas pelo mundo.





Vou mostrando como sou e vou sendo como posso, jogando meu corpo no mundo, andando por todos os cantos, e pela lei natural dos encontros eu deixo e recebo um tanto...


Vista da Cabana

Jantar de Ano Novo