sexta-feira, 30 de setembro de 2011

.Segundo Sol.

Leia ao som de Sigur Rós - Inní Mér Syngur Vitleysingur

A família partiu pela manhã, seguiram pra Áustria, só nos veríamos em duas semanas, eu e as meninas nos abraçamos tanto e tantas vezes ao se despedir que até fiquei cansada, elas ficaram acenando para mim até o carro deles virar a rua e sumir do meu campo de visão.
Eu ainda não acreditava que aquela noite embarcaria para a tão sonhada Islândia, meu voo Icelandair sairia do aeroporto internacional de Schiphol às 23h45.
Deixei a casa na rua Spitfire número 5 por volta das 18h, chequei todas as trancas, janelas, esvaziei a fruteira, tirei equipamentos eletronicos das tomadas, terminei de fazer a mala, fiz lanchinhos pra viagem, organizei o quarto, acionei o alarme, dei uma última olhadela pra grande casa e parti. Era um dia quente de verão, daqueles que o sol só se despedia as 23h e que me dão um bocado de saudades.
Peguei o trem errado, um que não fazia parada no aeroporto, fui parar em Amsterdam, conheci um africano refugiado do Congo que me contou toda a triste história da guerra civil em seu pais, ele gostou de mim, fez questão de me levar até o trem certo e se despediu calorosamente como se fosse um amigo próximo.
Encontrei-me com uma amiga au pair do sul do Brasil no aeroporto, a doce Beth, assistimos o primeiro tempo do jogo final da copa do mundo, Holanda contra Espanha, em um bar e depois em um grande telão instalado em frente ao Schiphol, com tantos outros holandeses esperançosos.
Antes de começar o segundo tempo, ainda em zero a zero, me despedi da Beth, fiz check in e fui pra sala de espera, assisti os momentos finais do jogo da janela do avião antes do mesmo decolar, vinte minutos depois o piloto nos deu a noticia que a Espanha havia ganhado, para a tristeza das tantas famílias holandesas a bordo, confesso também fiquei meio triste, ao pensar nas meninas.
Decolamos, já escurecia na Holanda, dez minutos depois já estávamos sobre o mar, era tão bonito, a escuridão foi devorando o oceano e quando já estavamos em completa escuridão, o sol voltou a despontar lá no horizonte e pouco depois nasceu pela segunda vez naquele dia para nós, meus olhos ficaram úmidos em lágrimas de alegria, lembrei-me do pequeno príncipe, que podia ver quantos pores-do-sol quisesse por dia em seu pequeno planeta, e que gostava de fazê-lo quando estava triste, não sei como cheguei a ter a chance de ter dois pores- do- sol no mesmo dia, mas a sensação sem dúvida não tinha nada a ver com qualquer tristeza possível.
Aterrissar na Islândia foi como aterrissar na Lua, nunca fui a lua, mas estou quase certa que o sentimento é parecido, aquele chão de lava de vulcão solidificada, todo aquela imensidão inabitada , questionei até se existia vida naquele "planeta". Eu não via a hora de poder pisar em tudo aquilo e explorar o que pudesse, me invadir de tanta luz, solitude e espaço. E foi o que fiz.
Tudo aquilo foi tão grandioso que hoje verbalizar é até meio difícil, se nostalgia me desse vontade de ver pores-do-sol, teria que ir e voltar lá muitas vezes no mesmo dia hoje.
E, foi verdade, não escureceu nenhum dia na Islândia.

Meu segundo por-do-sol.